Alfabetizando com os olhos do coração

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Você sabia que no dia 8 de setembro comemoramos o Dia Nacional da Alfabetização? E por que será que devemos separar um dia tão especial para tal celebração? Afinal, qual a real importância do letramento em nossas vidas?

 

Quantas perguntas! Mas poucas pessoas dão a atenção necessária a essa fase tão significante não apenas da nossa vida escolar, mas da nossa própria existência: o processo de alfabetização.

 

O ato de alfabetizar alguém é muito mais do que ensinar um sujeito a codificar e decodificar um sistema de escrita. É muni-lo de instrumento altamente eficaz e poderoso na luta por sua cidadania; é abrir-lhe os olhos em meio à escuridão, capacitando-o e ampliando sua visão de mundo, possibilitando que ele trilhe o próprio caminho.

 

Falamos sujeito porque sabemos que, ainda que a idade ideal para a alfabetização inicial seja na infância (por volta dos 6 anos de idade), essa não é a realidade de muitos brasileiros, nem mesmo na vida adulta. Infelizmente, há milhares de brasileiros que nunca frequentaram uma escola e por diversos motivos, como a distância ou inexistência de uma unidade próxima de casa, a falta de vaga em escolas públicas ou até mesmo a necessidade de trabalho precoce (trabalho infantil).

 

Um levantamento feito pelo Todos pela Educação* mostra que, no Brasil, entre 2019 e 2021, houve um aumento de 66,3% no número de crianças de 6 e 7 anos que não sabem ler nem escrever. Esse total passou de 1,4 milhão, em 2019, para 2,4 milhões, em 2021. Obviamente, esse número é alarmante, principalmente porque tivemos uma pandemia nesse intervalo de tempo; porém, há de se ressaltar que os dados já eram muito ruins antes mesmo de 2019.

 

Retomando o início desta escrita, no caso da alfabetização, seja ela em qual idade for, o papel do educador é fundamental para o sucesso do aprendiz. E não nos referimos aqui às escolhas de propostas metodológicas ou materiais didáticos para as aulas; falamos de material humano. O carinho, a escuta atenta, o toque, o olhar singular para cada estudante, a compreensão das suas dificuldades e o reforço das suas grandezas são elementos significativos no momento da aprendizagem.

 

Falamos de um educador que reconhece que em sala de aula há sujeitos singulares, cada qual com um conhecimento prévio, uma história e suas experiências de vida. Que, de alguma maneira, entende que o caminho para a alfabetização inicial se constitui ao longo do caminhar. Em outras palavras, que esse caminho “vai se constituindo como resposta ao que os aprendizes podem e conseguem aprender – e não pela apresentação organizada de informações iguais para todos”, como nos ensina Rosaura Soligo, mestra e doutora pela Faculdade de Educação da UNICAMP.

 

Dicas e estratégias para encarar uma sala de aula são sempre muito bem-vindas, mas nada supera a mão firme do educador auxiliando, e muitas vezes guiando, a mão trêmula no papel; o abraço na hora necessária; as palavras de incentivo nos momentos de tentativa e acerto (porque não há erro quando o alfabetizando está experimentando a língua escrita; o que ocorre são posicionamentos diferentes no processo de alfabetização: uns no momento pré-silábico, outros no alfabético-silábico e alguns ainda tentando reconhecer o valor sonoro das letras).

 

Feliz daquele alfabetizador que entende os diferentes tempos de seus aprendizes, pois, dessa forma, sabe lidar melhor com a autocobrança de cada estudante e a comparação com os colegas; com a competitividade sem fundamento dos pais ansiosos; e com as inseguranças e medos de suas crianças, proferindo palavras de acolhimento e incentivo, que acalentam e despertam a motivação para seguirem adiante.

 

Feliz daquele que, como estudante, encontra um educador que lhe apresenta não somente o alfabeto, mas um mundo de possibilidades e de liberdade que se inicia por meio da alfabetização e do letramento. Que bom seria se todos tivessem essa experiência magnífica no primeiro e no segundo ano dos anos iniciais. Certamente, o mundo teria pessoas muito mais bem preparadas e mais confiantes para enfrentar desafios. Porque um dia, lá no primeiro ano, alguém olhou fundo nos seus olhos e, com todo amor no coração, segurou sua mão e disse: “Você pode! Eu confio em você!”

 

Por mais educadores alfabetizadores que sejam inspiração!

 

*Organização não governamental, sem fins lucrativos e sem ligação com partidos políticos, criada com a participação de diversos setores da sociedade brasileira. Seu objetivo é assegurar o direito à educação básica de qualidade para todos os cidadãos.

 


 

Tatiana Caetano

Tatiana Caetano

Formada em Letras pela Universidade Metropolitana de Santos (Unimes). Especialista em Educação Bilíngue e pós-graduanda em Neurocognição e Aprendizagem pelo Instituto Evangélico de Novo Hamburgo (IENH). Educadora há mais de 20 anos, com experiência em docência, coordenação e formação de educadores em centros de idiomas e escolas regulares, da Educação Infantil ao Ensino Médio.

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